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Quinta-feira, 25 de abril de 2024

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Boletim n°14 - Mai. 2010
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Ecologia numa visão mais ampla

Existe uma fábula bem conhecida sobre um beija-flor que tenta sozinho apagar um incêndio na floresta, levando a água para lá e para cá com o próprio bico. Quando os outros bichos lhe questionam a validade dessa ação, ele responde que está apenas fazendo a sua parte. Ou seja, se todos fizessem pequenos esforços em prol de uma causa comum, as coisas seriam bem melhores.

Mas como encontrar essa causa comum? E depois disso, como usar seus recursos, sempre escassos, de forma a se obterem resultados positivos e não o contrário do que se deseja? No caso do incêndio da fábula, a causa comum parece bem óbvia, mas na luta pela preservação de nossos recursos naturais, as coisas se confundem muito.

Quem visita uma mineradora, um lixão de uma grande cidade ou testemunha desmatamentos de grandes regiões, percebe que as coisas que afetam o meio ambiente podem ter escalas bem diferentes. Evitar andar em determinadas trilhas ou não jogar uma casca de banana na mata e brincar de reciclar lixo em casa são atitudes louváveis pelo seu princípio, mas não contribuem para o meio ambiente mais do que o tal beija-flor pode ter conseguido diminuir o incêndio florestal.

Sou totalmente contra jogar cascas e sementes nos pontos de parada das trilhas ou acampamentos, mas não por questões ecológicas e sim por questões de higiene e estética. Nos pontos de parada e acampamentos é onde ocorre o maior acúmulo de pessoas e aí é onde mais devemos nos preocupar em não sujar, para o lugar não ficar desagradável ou juntar ratos/cuícas. Quando você quer se livrar das suas cascas de banana e de laranja, muitos recomendam guardá-las em um saco plástico e levar esse saco com mais outros lixos orgânicos para passear por toda a caminhada para depois descartá-lo em uma lixeira. Mas será que a história tem aí um final feliz? Talvez hoje essa não seja uma atitude assim tão ecológica. Esse lixo, originalmente biodegradável, agora está envolto em um saco plástico não-biodegradável e será deixado em uma lata de lixo, onde ele depende de uma segunda pessoa, um gari, para continuar sua viagem. Passado algum tempo (de fermentação) desde o descarte, o gari eventualmente leva esse saco para um caminhão que, queimando diesel, fazendo barulho, irá passear pela cidade. Nesse caminhão, as suas cascas começam a liberar o chamado chorume, fedorento e intratável, que suja todo o caminho até chegar a um lixão. Aí, no lixão, as suas cascas de banana irão se juntar aos mais diversos tipos de lixo, dando volume a um resíduo muito mais tóxico. O seu lixo orgânico agora não é mais tão biodegradável… E se esse lixão não estiver bem construído, há uma boa possibilidade de essas cascas estarem no final dando sua pequena e significativa contribuição para contaminar um rio ou o mar.

Se você, por outro lado, tivesse preferido burlar “regras” e enterrar ou arremessar suas cascas no meio do mato (mas longe de pontos de parada/acampamentos) sou capaz de jurar que, no nosso maravilhoso clima tropical, depois de umas duas ou três semanas você não teria nenhuma lembrança ou vestígio dela no lugar onde ela foi jogada/enterrada, exceto, provavelmente, por um terreno um pouco mais fértil.

Apenas para reflexão sobre o tema, vou contar uma história. Na minha primeira viagem ao Peru, me lembro claramente de um gringo tentando dar uma lição de moral ecológica a uma senhora índia miserável que vendia frutas para os outros gringos e, por cortesia, as embalava em um famigerado saco plástico. A preocupação “ecológica” do tal gringo era que os sacos seriam jogados fora e contribuiriam para poluir o ambiente. Realmente dava para ver na estrada alguns sacos plásticos e outros resíduos enfeando o caminho. Mas pra mim isso não é ecologia. É paisagismo. Afirmo com toda a certeza que os danos ecológicos causados por aquela senhora, que não entendia nada do que o gringo estava falando, são infinitamente menores que os danos do próprio gringo com toda sua “consciência ecológica”. Aquela senhora praticamente só consome produtos de primeira necessidade, tirados diretamente da terra e poucos são industrializados. As roupas são remendadas e reaproveitadas ao máximo. Lavando em poucas ocasiões, usando pouco sabão. Para se locomover ela só anda a pé, ou quando é para pegar um carro, tem que fazê-lo junto com outras 8 pessoas (quando eu andei em um desses taxis ‘colectivos’, um Corolla SW, éramos um total de 10: 3 na frente, 4 no banco de trás e mais 3 no porta malas...). A casa dessa senhora não deve ter luz elétrica, água ou mesmo saneamento. Qual é a contribuição dela para degradar o ambiente? Acho que ela tem um bocado de crédito em relação a quem viaja freqüentemente de avião (coisa que queima muito mais combustível fóssil do que qualquer ônibus, mesmo desregulado), toma banho todos os dias, lava as roupas na lavanderia duas vezes por semana e consome uma infinidade de produtos supérfluos ou não que, por mais que se evite, vêm na maioria das vezes embalados em muito plástico...

A Unicerj acredita que o meio ambiente irá se beneficiar mais se mais pessoas tiverem contato direto com áreas naturais. Assim a sociedade aprende a valorizar o que já conhece. Fechar uma trilha ou um Parque alegando que as tais cascas estão afetando o DNA das formigas, ou que o gradiente de temperatura causado pelo calor das pessoas pode agredir as plantas, ou que o barulho de alguns caminhantes está estressando os macacos irá diminuir o amor da sociedade pelas suas áreas naturais e isso é andar na direção contrária à da preservação.

Algumas linhas desse raciocínio “ecológico” invariavelmente concluem que o grande mal do mundo é o homem e que quanto menos gente houvesse no mundo, melhor. Já vimos muita gente elogiando os absurdos aumentos das tarifas de Parques Nacionais, acreditando que apenas isso garante a tranqüilidade das trilhas e acampamentos. Outros chegam ainda a comentar que as mortandades causadas por guerras e desastres naturais teriam um saldo positivo para o planeta. Esse definitivamente não é o caminho da Unicerj.

Buarque


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